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André Liohn e o olhar a guerra

 André Liohn nasceu em São José do Rio Preto, um município do interior de São Paulo, onde viveu até os vinte anos. Após deixar o Brasil, mudou-se para a Noruega, onde começou a explorar sua paixão pela fotografia inicialmente como forma de expressão artística. Foi autodidata na maior parte da sua formação, contudo, um ponto crucial na sua formação foi o encontro com Antonin Kratochvil, renomado fotojornalista tcheco e membro da agência VII Photo Agency. Kratochvil atuou como mentor de Liohn, influenciando profundamente sua abordagem humanista e seu olhar sensível para temas complexos, como conflitos e crises humanitárias.

 Os primeiros trabalhos profissionais de André aconteceram em contextos locais, cobrindo eventos culturais e sociais na Europa e no Brasil. Em 2006, ao se mudar para a África, buscou documentar conflitos e crises humanitárias. Lá ele começou com freelancer, colaborando com agências de notícias e veículos internacionais e seu primeiro grande projeto de destaque foi a cobertura a guerra civil na República Democrática do Congo, onde suas imagens chamaram a atenção da mídia global

 Sua ascensão no cenário internacional do fotojornalismo, ocorreu durante a Primavera Árabe em 2011, quando André Liohn se estabeleceu  como um dos principais fotógrafos a documentar os levantes populares no Norte da África e no Oriente Médio. Particularmente sua cobertura na Líbia foi amplamente divulgada e premiada, dando a André uma reputação de profissional corajoso e sensível. Desde então ele tem trabalhado em zonas de conflito como síria, Ucrânia e Sudão do Sul, procurando sempre histórias individuais por trás dos grandes eventos.

Algumas das exposições do fotógrafo são Revogo, Na linha de frente, O gosto da guerra, KRIG e Assistência à saúde em perigo: Líbia e Somália no olhar de André Liohn.  Essa última foi patrocinada pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha, esteve presente na biblioteca parque Villa-Lobos e no Museu Nacional Honestino Guimarães em São Paulo. Mostrava setenta fotos realizadas em hospitais ameaçados e nas linhas de combate entre 2010 e 2013. Nelas podemos ver a dura realidade de dois países nos quais o Comitê Internacional da Cruz Vermelha atua.

Nessa coletânea de imagens também é possível mostrar a urgência de adotar medidas pelo fim da violência contra pacientes, instalações, veículos e profissionais de saúde em conflitos armados e emergências. Nos países retratados, Líbia e Somália, respectivamente, foi capturado cidades destruídas por enfrentamento constante entre forças dos governo e oposição.

Em sua atuação na Líbia, Liohn capturou de maneira vívida os perigos enfrentados pelos serviços de emergência nas linhas de frente, evidenciando as dificuldades no atendimento hospitalar e a notável coragem dos profissionais de saúde, que, inabaláveis, se dedicam a prestar assistência vital aos feridos. Por outro lado, na Somália, com o apoio do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, o fotógrafo mergulhou no cotidiano de um dos hospitais centrais da capital, oferecendo uma visão impactante. Essa série contrasta fortemente a sensibilidade e fragilidade do ambiente hospitalar com a brutalidade e o impacto da guerra. Contudo, a realidade mostra que hospitais e guerras estão tragicamente entrelaçados, pois, onde há conflito, inevitavelmente há feridos necessitando de cuidados, um aspecto que frequentemente não consideramos devido à instabilidade das zonas de conflito.

 Em termos gerais, as fotografias de André Liohn são caracterizadas pela abordagem humanista, que evita o sensacionalismo, buscando uma narrativa visual que privilegia a dignidade dos indivíduos, mostrando assim momentos íntimos e cotidianos em meio ao caos, o que revela a resiliência e esperança que existem em situações extremas. E para capturar essa perspectiva, Liohn muitas vezes vive com essas comunidades por longos períodos, a fim de criar um envolvimento pessoal com as realidades que retrata. Sendo assim, a fotografia para André também é um instrumento de denúncia e conscientização, pois suas imagens não só documentam, mas também questionam as estruturas de poder e as injustiças que perpetuam os conflitos, essa postura engajada então reflete a ética profissional que se compromete com a verdade e justiça social  

O trabalho de André com seu amplo reconhecimento, foi premiado com prêmios internacionais como World Press Photo e o Bayeux-Calvados Award for War Correspondents, méritos que celebram além de excelência técnica, mas dão destaque a relevância do olhar humanista em um mundo cada vez mais marcado por conflitos e desigualdades. Um marco importante na carreira de André Liohn foi o reconhecimento internacional por seu trabalho na Guerra Civil da Líbia, incluindo uma indicação ao Prix Bayeux-Calvados des Correspondants de Guerre e prêmios como o World Press Photo. Embora ele não tenha recebido a Medalha de Ouro Robert Capa, seu trabalho na Líbia consolidou sua reputação como um dos principais fotojornalistas latino-americanos em coberturas de conflitos.

 Um evento interessante do fotojornalista foi quando um dos casos de denúncia que o fotógrafo fez através do seu ofício foi contra Marco Vernaschi, um bolsista do Pulitzer Center e vencedor do World Press Photo, forçou uma mãe da Uganda a exumar o seu filho recém falecido e depois lhe deu dinheiro pelo feito, pois Marco posteriormente usou a foto para relatar sobre sacrifico humano. O caso levantou discussões sobre métodos de trabalho da fotografia, integridade jornalística e ética profissional, e as organizações World Press Photo e o Pulitzer Center foram pressionadas a se pronunciar sobre o caso, levantando questões sobre a responsabilidade dos fotógrafos em zonas de conflito ou em contextos sensíveis e foram levados a uma revisão dos códigos de conduta de organizações como a World Press Photo e o Pulitzer Center, com maior ênfase na ética e no respeito aos direitos das pessoas retratadas

    Além disso, o fotógrafo tem contribuído para a formação de novas gerações de fotojornalistas, compartilhando suas experiências e técnicas em workshops e palestras, sua atuação vai além da fotografia, sendo assim, se envolve em projetos humanitários e colabora com organizações não governamentais para ampliar o impacto do seu trabalho 

Referencias Bibliográfica

BAYEUX-CALVADOS AWARD. André Liohn: Coverage of the Libyan Conflict. Bayeux: Bayeux-Calvados Award for War Correspondents, 2011. Disponível em: www.bayeux-calvados.com. Acesso em: 10 out. 2023.

DER SPIEGEL. Through the Eyes of André Liohn: Documenting Conflict. Hamburg: Spiegel-Verlag, 2013. Disponível em: www.spiegel.de. Acesso em: 10 out. 2023.

G1 CEARÁ. Fotógrafo relata experiência como correspondente de guerra. Fortaleza: G1, 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/ce/ceara/especial-publicitario/unifor/noticia/fotografo-relata-experiencia-como-correspondente-de-guerra.ghtml. Acesso em: 10 out. 2023.

LIOHN, André. War and Peace: A Photojournalist’s Journey. São Paulo: Editora Fotografia Humanista, 2018.

LIOHN, André. Entrevista concedida ao programa Foto em Pauta. São Paulo: Canal Fotografia, 2020. Disponível em: www.canalfotografia.com.br. Acesso em: 10 out. 2023.

PERES, Michael R. (Org.). The Concise Focal Encyclopedia of Photography: From the First Photo on Paper to the Digital Revolution. Burlington: Focal Press, 2007.

ROSLER, Martha. Decoys and Disruptions: Selected Writings, 1975-2001. Cambridge: MIT Press, 2004.

SONTAG, Susan. Diante da Dor dos Outros. Tradução de Rubens Figueiredo. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

TERRA. República Centro-Africana: o silêncio sobre uma guerra civil que dura 10 anos. São Paulo: Terra, 2021. Disponível em: https://www.terra.com.br/nos/republica-centro-africana-o-silencio-sobre-uma-guerra-civil-que-dura-10-anos,f14c8aed405c352fffd556b0e3d7de28dc81dykp.html#google_vignette. Acesso em: 10 out. 2023.

THE NEW YORK TIMES. André Liohn’s Lens on the Libyan Revolution. New York: The New York Times, 2011. Disponível em: www.nytimes.com. Acesso em: 10 out. 2023.

TIME MAGAZINE. The Human Cost of War: André Liohn’s Photography. New York: Time Inc., 2012. Disponível em: www.time.com. Acesso em: 10 out. 2023.

WORLD PRESS PHOTO. André Liohn: Award-Winning Photographs. Amsterdam: World Press Photo Foundation, 2012. Disponível em: www.worldpressphoto.org. Acesso em: 10 out. 2023.

Exposição fotográfica “Assistência à Saúde em Perigo: Líbia e Somália no olhar de André Liohn”. Disponível em: <https://www.icrc.org/pt/event/assistencia-saude-em-perigo-libia-e-somalia-no-olhar-de-andre-liohn>. Acesso em: 19 mar. 2025.Mostra fotográfica destaca a dura realidade dos serviços de saúde na Líbia e Somália. Disponível em : <https://www.icrc.org/pt/content/mostra-fotografica-destaca-dura-realidade-dos-servicos-de-saude-na-libia-e-somalia>. Acesso em: 25 mar. 2025.

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